Especialistas, autoridades, pais e mães debateram na Câmara dos Deputados, na última terça-feira (03/07), o Projeto de Lei
5921/01, que pretende proibir a publicidade destinada a vender produtos infantis. O projeto aguarda parecer do relator e, caso aprovado, seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça.
Uma das participantes do movimento de mães por uma "Infância Livre do Consumismo", a publicitária Tais Vinha, explicou que o objetivo do grupo é a promoção do debate sobre a publicidade infantil. "Tem que haver um comprometimento maior com a proteção da infância. Visto que a responsabilidade pela educação infantil não cabe só aos pais, inclui também o poder público e toda a sociedade", afirmou.
A porta-voz do coletivo defendeu o projeto por considerar que a publicidade deve ser dirigida aos adultos e destacou os efeitos provocados pela publicidade, como obesidade infantil, sedentarismo, aumento do consumismo, além da distorção de valores, que muitas vezes, competem em desigualdade com o discurso sedutor da publicidade.
Ineficácia da autorregulamentação
Taís criticou a atuação do Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar) por não atender às denúncias a tempo, conforme o exemplo citado por ela. "Eles diziam no merchandising: foi descoberto o segredo de beleza da Barbie. Como é que se diz para uma criança que uma boneca de plástico tem segredo de beleza? Esse é o ideal de beleza que estamos fazendo uma criança acreditar? Esse ideal não existe, é plástico. Isso, na minha consideração, é propaganda enganosa. Fiz essa denúncia ao Conar em 2010, até hoje não tive retorno. Eles sequer acataram minha denúncia. O que a gente sente é que os pais não têm a quem recorrer. A gente quer participar, mas a gente queria que a coisa fosse rápida. O que adianta tirar (o comercial do ar) dois, três meses depois que a mensagem já atingiu milhões de crianças?"
A advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e conselheira do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Mariana Ferraz, considera que ao ser analisado o "contexto de consumidores formado por crianças, podemos identificar que elas são hipervulneráveis com relação aos outros consumidores. Isso é o que caracteriza a publicidade abusiva, o que se torna ainda mais preocupante".
Para Ekaterine Karageorgiadis, do Instituto Alana, é necessário modificar o texto original do projeto para que a proibição seja para a publicidade direcionada às crianças e não aos produtos infantis. "A publicidade de produtos infantis pode existir desde que direcionada aos pais", explicou.
Recentemente o Instituto Alana lançou na intenet um manifesto (
www.publicidadeinfantilnão.org.br) que aponta as principais consequências da publicidade para as crianças: obesidade infantil, erotização precoce, estresse familiar, conflito entre o a ideia de "ter" e "ser" e alcoolismo. "As crianças não diferenciam a publicidade da programação, elas não têm discernimento e não sabem que podem optar por comprar ou não", acrescentou Ekaterine.
Interferência do Estado
Para o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), Synésio Batista, a publicidade infantil é fundamental. Na opinião dele, toda criança tem o direito de ter brinquedo, e a publicidade ajuda a aumentar a produção, despertando o interesse e deixando a criança informada. "Não se oferece um produto dizendo o que ele não tem", afirmou.
Synésio criticou a interferência do Estado nesse tema. "Esse projeto de lei não tem consenso. O Estado não pode desligar a Internet ou proibir a viagem de crianças ao exterior. Vai acabar criando um sistema de castas, onde há aqueles com informação e aqueles sem", disse. O presidente da Abrinq destacou ainda que são as mães que compram 70% dos brinquedos no Brasil. "A mãe sabe muito bem o que está fazendo. Eu prefiro confiar na mãe do que na ação do Estado para regular o que a família deve fazer. Eu prefiro o respeito a família brasileira".
Apesar de convidado, o Conar não compareceu à audiência pública. Foi representado pelo vice-presidente da Associação Brasileira de Anunciantes, Rafael Sampaio. Contrário à proibição da publicidade infantil, o dirigente defendeu a autorregulamentação como o melhor caminho para coibir abusos.
Relator se posiciona
O relator do projeto, na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, deputado Salvador Zimbaldi (PDT-SP), apresentará em agosto seu parecer. O texto já foi alterado nas comissões de Defesa do Consumidor e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio.
Após a audiência pública, Zimbaldi afirmou que uma lei sobre publicidade infantil é necessária porque o Conar não tem sido eficaz. "Nós vamos tentar buscar o melhor para população e particularmente para as crianças. Hoje, estamos convivendo com a população infantil obesa, por conta do consumismo, do sedentarismo. O que queremos, na verdade, é buscar um meio termo para que a propaganda não venha a ser restrita, mas, por outro lado, também não haja um incentivo, um estímulo absurdo ao consumo, conforme estamos vivenciando hoje."
Fontes:
Agência Câmara de Notícias
Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
Leia também:
Crescimento adequado é apenas um dos fatores que indica boa nutrição
Excesso de açúcar industrializado é prejudicial à saúde das crianças
Câmara dos Deputados debaterá projeto de lei que proíbe publicidade de alimentos para crianças
Chile aprova lei que proíbe publicidade de alimentos não saudáveis para crianças menores de 14 anos
BH sanciona lei que impede venda casada de alimentos com brinquedos
OPAS divulga diretrizes sobre publicidade de alimentos para crianças
Nova Iorque quer proibir venda de refrigerantes com mais de 500ml
Propaganda tem influência negativa na alimentação das crianças
Leite materno: O melhor alimento, na melhor embalagem
O que a criança pequena deve comer: certezas e dúvidas